Receber um novo coração: o transplante cardíaco ou transplante de coração

São cada vez mais os transplantes de coração que correm bem!

Milhares de adultos e crianças por todo o mundo vivem, saudáveis, com o coração que outrora pertenceu a outra pessoa.

O que até há poucas décadas era impensável é hoje possível. Descubra mais sobre o transplante cardíaco e sobre uma outra hipótese oferecida pela tecnologia: o coração artificial.

O primeiro transplante de coração (transplante cardíaco) foi realizado pela primeira vez em 1967 pelo cirurgião sul-africano Christiaan Barnard. Envolveu uma equipa de 20 cirurgiões, muitas horas de bloco operatório e o paciente, Louis Washkansky, acabou por morrer dias depois.

No entanto, ainda assim, ao contrário do que geralmente se pensa, foi um sucesso: abriu a porta para um procedimento que, não sendo isento de riscos, é a melhor hipótese para muitas pessoas, oferecendo-lhes anos de vida que de outra forma não teriam hipótese de chegar a viver.

Não é um procedimento que se faça todos os dias e, na verdade, o número de intervenções realizadas em Portugal tem vindo a baixar nos últimos anos. De acordo com os dados do Instituto Português do Sangue da Transplantação, no ano passado foram realizados 30 transplantes, um número mais baixo que o registado em 2011 e 2010 (com, respetivamente, 46 e 50 transplantes efetuados).

Mesmo não sendo tão frequente como outras terapêuticas, o transplante cardíaco é uma das formas mais eficazes de prolongar, com qualidade, a vida de doentes que sofrem de algumas patologias cardíacas.

Entre as situações mais vulgares elegíveis para o transplante, estão, como nos conta o cirurgião cardiotoráxico Miguel Sousa Uva, “a cardiomiopatia dilatada de etiologia idiopática, isquémica e valvular responsável de insuficiência cardíaca refratária ao tratamento médico”. Nomes e conceitos complicados que, numa visão muito simplista, se poderiam resumir da seguinte forma: problemas cardíacos que, independentemente da sua origem, provocam uma insuficiência que não é possível resolver com outro tipo de tratamento.

 

Transplante de coração e pós-transplante

Não é tarefa fácil, mas pedimos ajuda ao cirurgião cardiotoráxico Miguel Abecassis para nos tentar explicar de forma simples como é realizado um transplante cardíaco. De acordo com o cirurgião, excluindo as cardiopatias complexas, o gesto transplantação consiste em quatro ou cinco ligações vasculares (chamadas de anastomoses) : “mais concretamente entre as aurículas direitas ou veias cavas superior e inferior, entre as aurículas esquerdas e entre os grandes vasos (aorta e artéria pulmonar).”

E como começa o “novo” coração a bater dentro do peito do seu recetor? Esqueça aquela ideia dos filmes em que vê o cirurgião a pressionar o coração com os dedos para que ele comece a bater. Na verdade, conforme nos conta Miguel Abecasis, o coração é um órgão automático sendo a sua atividade comandada por um “pacemaker interno” ( o chamado nódulo sinusal) e, assim completada a ligação da aorta e reperfundidas as coronárias, dá-se uma recuperação espontânea da sua atividade elétrica, logo, dos batimentos cardíacos. Se a atividade for desorganizada e ineficaz, é necessário fazer cardioversão elétrica e/ou química, ou seja, através de um choque elétrico ou de meios farmacológicos, converter o ritmo irregular num ritmo cardíaco regular e eficaz.

Os riscos associados aos transplantes de coração são pequenos, “diria que inferiores a 2 por cento” refere Miguel Abecasis. Mas claro que eles variam muito de acordo com o caso concreto, podendo ser bastante mais elevados. Por um lado, o estado do recetor que poderá muito débil, como em situações de choque ou falência multiorgânica, em que o risco poderá ser maior, chegando aos 20 por cento.

Por outro, o cirurgião conta-nos que um fator que interfere com os resultados imediatos é aquilo que se chama tempo de isquemia: o tempo que medeia entre o parar do coração durante a colheita e a recuperação da atividade elétrica no novo recetor. “Sabe-se que a partir das quatro horas de isquemia o risco aumenta”, daí que a coordenação entre a equipa que faz a colheita do órgão e a que o implanta, bem como a distância física entre dador e recetor sejam de grande importância.

Terminada a cirurgia – que pode durar entre três a seis horas – o tempo de recuperação, como nos conta Miguel Sousa Uva, vai depender do estado geral do doente, podendo variar entre 15 dias e um mês. Depois disso, o acompanhamento médico é, de acordo com o cirurgião cardiotoráxico, muito apertado no primeiro ano pós-operação, já que existem alguns riscos de complicações tardias. Miguel sousa Uva refere que a taxa de sobrevivência é de 70 por cento ao fim de um ano.

 

Com o coração de uma criança nas mãos

A transplantação em crianças, até 15 anos, envolve particularidades e dificuldades acrescidas. Desde logo porque é mais difícil encontrar um dador compatível. Segundo o cirurgião cardiotoráxico Miguel Abecasis “para além da compatibilidade biológica (grupo sanguíneo e HLA), terá que ser também compatível em tamanho: no máximo duas vezes o peso do recetor, o que desde logo limita o número de possíveis dadores.”

Por outro lado, como refere o cirurgião, as variações anatómicas quer de tamanho quer de posição das várias estruturas em crianças com cardiopatias congénitas também são uma questão a ter em consideração, uma vez que a raridade de algumas das patologias torna o processo de aprendizagem e o adquirir de experiência necessariamente mais difícil, conclui. De resto, desde o início da transplantação cardíaca em Portugal, há mais de 25 anos, foram realizadas cerca de 32 transplantações cardíacas em idade pediátrica 16 delas no Hospital de Santa Cruz.

Também no Hospital de Santa Cruz, Miguel Abecassis fundou, em conjunto com outros médicos , enfermeiros, pais de crianças operadas e administrativos a Associação Coragem, uma associação de apoio a crianças com doença cardíaca.

A associação nasceu para dar apoio a todas as crianças tratadas no hospital e também aos seus pais. Um apoio que vai do alojamento dos pais junto ao Hospital durante o internamento, aos custos de alimentação e transporte de e para o hospital, mas também no que toca à informação acerca patologia dos filhos e tratamento proposto, nomeadamente através da troca de experiência com outros pais e à ocupação tempos livres das crianças durante o internamento.

“De referir que a atividade dos vários membros é completamente voluntária e não remunerada”, salienta Miguel Abecassis.  Os meios de que a associação dispõe resultam de algumas iniciativas como a edição e venda de uma agenda (elaborada e ilustrada pelas crianças operadas) no final de cada ano bem como de donativos de particulares ou empresas.

 

Berlin Heart , um coração artificial

Por vezes, uma das etapas mais difíceis de um transplante não é o procedimento em si, mas conseguir, chegar até ele. Para quem precisa de um novo coração, muitas vezes, a espera por dador compatível é longa, além de arriscada. Uma situação que se verifica particularmente nas crianças, já que encontrar um dador é, por norma, um processo mais demorado.

Para estas crianças que enfrentam a espera pelo transplante e que – no entanto, têm situações clínicas incompatíveis com a espera – há, desde há uns anos, uma solução: um coração artificial chamado Excor Pediatric System, vulgarmente conhecido por Berlin Heart, o nome da sociedade alemã que o fabrica.

São fabricados em vários tamanhos de forma a que se possam adaptar a bebés, crianças e adolescentes e, segundo a Food and Drugs Administration (FDA), aumentam as hipóteses de sobrevivência de crianças que esperam um transplante cardíaco, em comparação com o uso de um dispositivo tradicional de circulação extracorpórea. Além disso, também pode ser utilizado como uma ponte para a recuperação, por exemplo, em casos de enfarte agudo do miocárdio.

O Berlin Heart Excor é das tecnologias mais avançadas em corações artificiais e consiste – de forma muito simplista – num conjunto de tubos e bombas ligadas a um ou dois ventrículos, conforme a necessidade, que transportam e bombeiam o sangue, simulando o funcionamento do coração, ficando a bomba do lado de fora do corpo.

A primeira vez que que foi usado em Portugal num paciente pediátrico foi em Agosto de 2015, numa criança de 22 meses, numa cirurgia feita no Hospital de Santa Marta, em Lisboa, pelo cirurgião José Fragata.

Vasco, o menino transplantado, era saudável até que aos 21 meses uma infeção viral fez com que o coração fosse afetado e deixasse conseguir bombear o sangue necessário ao organismo. Durante cerca de 4 meses o Berlin Heart segurou-o à vida. No final de Novembro de 2015 foi encontrado um dador compatível e o menino recebeu um transplante cardíaco.

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