Medicina de Viagens e Consulta do viajante

Consulta do viajante, a preparação da viagem a pensar na saúde e evitar doenças.

O que é uma consulta de medicina de viagens e quem a deve fazer? Quais são os riscos que corre quem viaja para países tropicais? Quais as diferenças na abordagem ao viajante que parte por muito tempo? E a consulta pós-viagem, quem a deve fazer?

Encontre aqui estas e muitas outras respostas essenciais a quem pretende ir de viagem.

“Ninguém que vai almoçar pensa, quando lhe põe o prato à frente, que algum dos alimentos pode estar contaminado com bactérias ou com vírus que lhe podem depois provocar uma diarreia, da mesma forma que ninguém quando sai à noite para ir ver um espetáculo pensa que tem de levar roupas que o cubram porque pode haver um mosquito que o pique e lhe pode provocar uma doença grave”, lembra o infeciologista e especialista em Medicina Tropical Jorge Atouguia.

E este é o mote para a necessidade de fazer uma consulta do viajante: se a viagem for para uma zona onde o indivíduo terá necessariamente de mudar de rotinas porque se não as alterar, isso significa que pode estar sujeito a adoecer.

Em termos práticos, quer isso dizer que para o viajante europeu, dentro da Europa, não há essa necessidade porque o local de partida e destino são na mesma zona geográfica e porque as condições sanitárias são relativamente controladas no hemisfério norte. “Mas por exemplo quando há um surto de influenza na Europa, provavelmente um colega meu angolano terá de aconselhar os seus viajantes que vêm para a Europa para terem esse cuidado”, refere Jorge Atouguia.

Da mesma forma, apesar de as pessoas estarem mais despertas para a necessidade de fazer uma consulta prévia quando viajam para a o hemisfério sul ou para países asiáticos, este aconselhamento prévio é também necessário em situações nas quais vai haver uma diferença de altitude considerável ( leia Mal de altitude ou doença da altitude, o que é! ) ou se a viagem vai incluir atividades com risco extra, como mergulho.

A medicina das viagens é baseada no conceito de redução do risco, sendo que, neste contexto, “risco” é a possibilidade de algo de mal acontecer com o viajante durante (e após) a viagem.

Daí que na consulta sejam abordados precisamente os riscos, que conforme explica Jorge Atouguia, giram em torno de três grandes eixos:

  • primeiro, o próprio viajante (que se tiver já algum problema de saúde pode vê-lo agravar-se no local para onde vai quer através das características do ecossistema e climatéricas, quer através de medicações e vacinações que vai ter de fazer);
  • segundo, o local de destino e o seu risco intrínseco (condições mais ou menos insalubres, existência ou não de doenças transmitidas por insectos, etc)
  • terceiro, o eixo da relação que vai existir entre este viajante e o local, ou seja, as actividades que ele vai desenvolver no local. Assim, numa consulta do viajante, ao contrário do que por vezes se pensa, não há “check lists”.

Consulta do viajante

Preparar a viagem

A consulta deve ser feita 15 dias a três semanas antes da viagem.

“Para locais onde há muitos riscos do ponto de vista de doenças transmissíveis que estão dependentes de surtos epidémicos, surtos esses que estão relacionados, por exemplo, com a pluviosidade e a temperatura, se a antecedência é muita, a informação disponível na altura da consulta pode já não estar atualizada na data da partida porque as condições já são diferentes”, explica o especialista.

Mas, por outro lado, como há situações nas quais as vacinações devem ser feitas com cerca de 30 dias de antecedência, o ideal é ligar com mais antecedência  para que a data de marcação seja ajustada às necessidades.

Uma boa preparação da viagem pode implicar mais do que uma visita ao especialista em medicina de viagens. Como frisa Jorge Atouguia, sobretudo se o período de viagem é um pouco mais prolongado, convém fazer antes uma consulta de rotina noutros especialistas, nomeadamente, no dentista e no ginecologista de forma a evitar imprevistos que obriguem o viajante a recorrer a serviços locais.

Isto é especialmente relevante, claro, se estamos a falar de destinos com más condições do ponto de vista de assistência médica, nos quais têm de se equacionar, por exemplo, o risco de má desinfeção dos instrumentos utilizados.

Uma grande preocupação dos viajantes costuma ser levar consigo um kit de medicamentos que responda a quase todas as necessidades que possa encontrar pela frente, sendo que esta preocupação está especialmente presente nos viajantes que se deslocam para zonas com serviços de saúde considerados deficientes e acesso difícil a medicamentos.

Jorge Atouguia tem como princípio geral recomendar que, por um lado, o indivíduo leve consigo os medicamentos que toma habitualmente, segundo, os medicamentos que sabe utilizar por rotina ou para problemas específicos que tem – e aqui o médico deve ter em atenção não escolher marcas diferentes daquelas a que o viajante está habituado a utilizar para não gerar confusões.

“ Aquilo que eu faço com os meus viajantes é dar-lhes uma lista de medicamentos possíveis para que eles vejam o que costumam utilizar e, dentro desta lista, existem coisas tão práticas como um segundo par de óculos e preservativos”, revela.

No destino e após o regresso

Feitas as consultas necessárias, recebidas as vacinas, iniciadas as profilaxias adequadas e munido de conselhos e recomendações pertinentes, põe-se o viajante a caminho… Mas cumprir com as recomendações não é fácil para todos.

Os erros mais frequentes são os alimentares. As pessoas a quem colocamos limitações em locais onde a água não é potável e que terão de ter limitações de consumo de certos alimentos, sobretudo os crus, o gelo, as saladas, por vezes têm dificuldade em cumprir”, conta-nos Jorge Atouguia. Por essa razão, as doenças que acabam por ser mais vulgares  –  que são também, felizmente, as mais benignas , traduzem-se numa diarreia ou descompensação intestinal.

Muitas vezes, como lembra o infeciologista, são erros cometidos para não ferir suscetibilidades e exemplifica: um administrador de um banco que vai três ou quatro dias para assinar um documento e que, à partida, não tem razão para correr grandes riscos, não está isento de ter problemas: basta aparecer alguém a oferecer-lhe uma bebida com gelo que não queira recusar por questões protocolares.

Já os erros relacionados com a prevenção da malária, como interromper a profilaxia, é importante ter noção que podem ter consequências graves ou mesmo fatais.

Dependendo do destino, do tempo de permanência e de ter tido ou não problemas de saúde, pode ou não justificar-se uma nova consulta após o regresso. “Se vamos para um destino de risco controlado, mas tivemos problemas de saúde enquanto lá estivemos, devemos ir a consulta após o regresso.

Da mesma forma, mesmo não tendo tido problemas se estivemos durante muito tempo num destino de risco também convém fazer uma consulta, até porque há muitas doenças transmissíveis, sobretudo por parasitas, que se mantêm silenciosas durante muitos anos “, revela Jorge Atouguia.

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O viajante imigrante e o viajante frequente

Mas e quem vai não de visita, mas para ficar muitos meses, um ano, dois anos?

A abordagem é naturalmente muito diferente. “Um viajante de curta duração deve ser instruído quando aos cuidados necessários para, no fundo, o tentar isolar dos riscos que estão à sua volta.

Já o viajante que fica muito tempo mesmo não tendo nenhuma imunidade em relação àquelas doenças, vai ter de se adaptar à realidade onde vai viver”, comenta Jorge Atouguia.

É o caso de David Fernandes, fundador e presidente da ONG The Big Hand, a residir em Moçambique desde 2010. A sede do seu projeto funciona em Chimoio, a capital da província moçambicana de Manica.

A cidade tem hospital, mas David trabalha essencialmente nas aldeias em volta que têm apenas posto médico com condições e recursos muito limitados e técnicos de saúde com pouca formação. Assim, aproveita sempre as vindas a Portugal para fazer sempre uma consulta de Medicina Geral e Familiar e uma Consulta do Viajante.

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