Flora Intestinal: como mantê-la forte e saudável?

Um universo de microrganismos vive no interior da sua barriga. Mas não se assuste. Fundamentais para a manutenção da flora intestinal e para o funcionamento do intestino, estas bactérias ajudam a proteger a sua saúde.

A simples ideia pode parecer algo bizarra e inacreditável, mas sabia que milhões de bactérias habitam o nosso intestino e desempenham um papel essencial para o organismo? Não, não estamos a mentir. Ao seu conjunto chama-se flora ou microbiótica intestinal e esta é indispensável ao funcionamento do intestino, à manutenção de um trânsito intestinal normal e, consequentemente, da nossa saúde.

De um ponto de vista biológico, os nossos intestinos são a nossa raiz e têm a mesma função no corpo humano que as raízes das plantas têm para a saúde das mesmas. Uma planta com raízes fortes e um bom solo cresce forte e saudável, da mesma forma que uns intestinos saudáveis podem ser o ponto de partida para ajudar a criar seres humanos saudáveis.

Dentro do tubo digestivo humano, por exemplo, existem dez vezes mais bactérias do que as células que formam o corpo – cem biliões. Estes microrganismos não são, ao contrário do que muitas pessoas pensam assim que ouvem falar em bactérias, prejudiciais para a saúde. Muito pelo contrário. Eles mantêm uma convivência pacífica e harmoniosa no nosso organismo, contribuindo para o seu equilíbrio.

João Ramos de Deus, gastroenterologista, explica que as bactérias que constituem a flora intestinal “ajudam na digestão dos alimentos, controlam (por competição) o crescimento de microrganismos patogénicos (outras bactérias, fungos, protozoários, etc.), promovem o bom funcionamento intestinal e reforçam as defesas imunitárias”. No fundo, são como um batalhão de pequenos soldados que constituem um escudo protetor e lutam para nos proteger de infeções e outras doenças.

Nos intestinos existem bactérias residentes, responsáveis pelos múltiplos efeitos benéficos da flora intestinal, e bactérias passageiras, compostas por uma grande variedade de estirpes e que, em condições ideais de saúde, devem existir em pequena quantidade.

Paula Ravasco, nutricionista, e Pedro Neves, especialista em Ciências da Nutrição, revelam que “embora se estime que existam entre 300 e 1000 espécies diferentes de bactérias nos nossos intestinos, 99 por cento da nossa flora intestinal é apenas constituída por 30 a 40 espécies”, que se nutrem, em parte, dos alimentos que ingerimos.

De acordo com os investigadores da unidade de nutrição do Instituto de Medicina Molecular (IMM), “as principais famílias de bactérias presentes no intestino são Lactobacillus e Bifidobacterium”. Estas são as bactérias benéficas para a flora intestinal e também aquelas que evitam as que prejudicam o nosso organismo de se multiplicarem e causarem problemas.

As bactérias amigas da sua saúde:

O equilíbrio entre bactérias benéficas e nocivas é fundamental para a manutenção de um estado de boa saúde. Cada uma das bactérias que vive na nossa barriga tem o seu papel na digestão e, como João Ramos de Deus sublinha, “cada individuo tem a sua flora intestinal própria e única, adquirida nos primeiros meses de vida”.

A colonização de bactérias começa assim que se nasce. A amamentação e o contacto com o mundo asseguram a formação da flora intestinal, que difere consoante os hábitos alimentares adotados. Isto significa que “uma boa alimentação é importante na manutenção e recuperação da flora intestinal quando desequilibrada”, afirmam os investigadores do IMM.

Assim, para manter a microbiótica intestinal ou repô-la, se necessário, é fundamental alimentar estes microrganismos e recrutar novos moradores, dando prioridade à ingestão de alimentos ricos em bactérias como Bifidobacterium e Lactobacillus, pois, como já vimos, são as principais famílias de bactérias que habitam na nossa barriga e reduzem a concentração dos microrganismos nocivos, mantendo a flora intestinal em níveis aceitáveis pelo organismo.

Para preservarmos “a flora intestinal devemos incluir na nossa alimentação alimentos ricos em prebióticos e probióticos, como por exemplo o iogurte”, recomendam Paula Ravasco e Pedro Neves. A principal diferença entre ambos é que os alimentos probióticos devem os seus efeitos saudáveis aos microrganismos vivos que contêm, enquanto que nos prebióticos os benefícios advêm da presença de uma fibra que favorece o desenvolvimento de uma flora intestinal benéfica.

Os prebióticos são alguns tipos de fibras alimentares, ou seja, hidratos de carbono, que se encontram naturalmente presentes em fruta e vegetais como por exemplo, a banana, a maçã, a cebola, o alho, o tomate, a alcachofra, mas que também se acrescentam a outro tipo de produtos. Neste caso, estamos a falar de sumos, bebidas de leite e fruta, alguns tipos de bolachas, cereais, e iogurtes, todos eles enriquecidos com fibras solúveis, como a inulina e a oligofrutose.

Por sua vez, os probióticos são uma classe de bactérias “boas” ou benéficas que estão presentes em alguns iogurtes e leite fermentados. Estes alimentos contêm fermentos lácticos (bactérias) vivos, que resistem à digestão no estômago e chegam vivos ao intestino, interagindo com as bactérias da flora intestinal e impedindo a invasão de bactérias nocivas.

Para além do consumo deste tipo de alimentos, é necessário seguir uma regra que já conhecemos bem e da qual a nossa saúde também depende: “é necessário manter uma dieta equilibrada e rica em vegetais hortícolas, frutos, reduzir a quantidade de proteína animal e reduzir o consumo excessivo de açúcares”, sublinham Paula Ravasco e Pedro Neves.

Existe ainda a possibilidade de recorrer a suplementos alimentares que podem ser usados como complemento de uma dieta variada, no entanto, os investigadores do IMM realçam que ainda não está demonstrada a necessidade ou benefício do uso de suplementação de prebióticos ou probióticos.

Quando a flora intestinal está fragilizada:

Na maior parte do tempo, as bactérias benéficas prosperam e conseguem manter uma flora intestinal saudável e equilibrada. No entanto, as bactérias “más” ou patogénicas podem provocar desequilíbrios e levar à doença e mal-estar. Esta situação pode dever-se a vários motivos, nomeadamente à toma de antibióticos e outros medicamentos, a uma alimentação incorreta ou ao stress.

Como resultado destes desequilíbrios “surgem quebras do sistema imunitário, défices de vitaminas e suas consequências, distúrbios intestinais, quer no sentido da diarreia, quer da obstipação [prisão de ventre], doenças de pele, entre outras”, alerta o gastroenterologista.

Se a situação não for tratada no sentido de repor o equilíbrio da flora intestinal, os sintomas podem tornar-se crónicos (como no caso do síndroma do cólon irritável) e comprometerem o sistema imunitário, levando a outras doenças mais sérias.

Agora que já sabe que precisa de manter as bactérias benéficas saudáveis e bem nutridas, não deixe de cuidar da sua flora intestinal. Aposte numa alimentação rica em fibras e zele pela integridade e bem-estar do seu intestino. E, claro, pela sua saúde também.

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